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Os Heróis Precisam ser Brancos? A falta de representação no Cinema e TV

  • Foto do escritor: Pedro Lacerda
    Pedro Lacerda
  • 14 de abr. de 2016
  • 3 min de leitura

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Como qualquer criança bombardeada com a sua capacidade criativa e a incapacidade de fazer amigos, desde muito novo eu tinha o costume de passar o dia inteiro sentado em um canto criando mundos na minha cabeça com nada mais do que a inspiração das minhas séries, desenhos e quadrinhos favoritos. De vez em quando eram grandes aventuras pelo espaço e tempo, outras um simples passeio de bicicleta que me lavaria a encontrar uma caverna secreta no matagal atrás da minha rua na qual vivia o último unicórnio.


Porém não importa o tema, conforme fui crescendo descobri uma semelhança entre todas essas histórias: eram sempre protagonizadas por um homem branco, ou havia um me acompanhando quando eu era o protagonista. Claro que eu tinha heróis negros, asiáticos, heroínas que admirava tanto quanto os Supermans e os Tommys desse mundo, mas em comparação esses ídolos eram um grupo minúsculo. Foi então que me dei conta de verdade, esse era o meu padrão imposto pelo material de entretenimento que consumi nos primeiros quinze anos da minha vida. Foi quando comecei a me questionar do por que daquele personagem ser branco e homem? E a resposta é algo do qual já falei algumas linhas acima, essa era a minha referência.


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Essa prévia da minha futura autobiografia foi inspirada pelas discussões que ressurgiram nessa quinta-feira (14/04) depois da divulgação da primeira foto de Scarlett Johansson como a protagonista da adaptação do mangá e anime Ghost in the Shell, pela DreamWorks, Paramount Pictures e Steven Spielberg. Como era de se esperar a escalação de uma atriz branca para viver uma personagem originalmente asiática levantou mais do que algumas sobrancelhas. O fato é que Hollywood está acostumada a ‘’lavar de branco’’ papeis que deveriam ser dados a atores de cor, mulheres, gays e transexuais.


Existe uma cultura do medo da rejeição entre as pessoas que decidem que atores serão contratados; o medo de que o público não conseguiria se identificar com um protagonista que não fosse homem ou ao menos branco do corpo sarado. Esse medo é injustificado e totalmente irracional, claro, mas sustentado pelo fato de que as produções com elencos diversificados são ‘’menos populares’’ pelo simples fato de que esse tipo de produção não recebe sequer um terço dos investimentos e interesse da indústria que projetos com personagens e atores brancos e heterossexuais recebem. E isso não afeta só atores, mas esse pensamento irracional e absurdo faz com muitos estúdios e editoras ignorem a enorme quantidade de talento entre escritores, diretores e desenhistas de cor, mulheres, homossexuais.


Ter obras com protagonistas e criadores de cores, gêneros e sexualidades diversas não é importante só para pessoas desses grupos que não têm heróis parecidos com elas para se relacionar. É importante ter o fato social em mente, mas a diversidade é importante de um ponto de vista criativo também. A indústria do entretenimento sofre cada vez mais com produções com a mesma trama, os mesmos personagens, nenhuma inovação.

A diversidade é extremamente importante em um mundo no qual personagens indianos ou árabes são motoristas de táxi ou terrorista, negros são bandidos ou malandros da rua, asiáticos são CDFs superinteligentes com sotaques ‘’engraçados’’ e problemas sociais; ou mulheres que precisam ser resgatadas e que as histórias se resumem ente o homem A e o homem B. Isso sem mencionar que todo personagem transexual precisa ser prostituta ou vítima (ah, Arquivo X, por quê?), focando na prostituta porque se a representação de mulheres transexuais é problemática, a de homens transexuais é um ser a beira da extinção prematuramente.


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Scarlett Johansson com certeza é uma ótima atriz, mas não deveria interpretar a Motoko Kusanagi quando existem dezenas de atrizes asiáticas extremamente talentosas que são perfeitas para o papel. E muito menos Nat Wolff deveria ser o Yagami no filme de Death Note, tá senhora Netflix? Sem mencionar que escalar Tilda Swinton para viver um personagem que nos quadrinhos é um homem asiático em Doutor Estranho (Marvel Studios), não é a melhor maneira de contornar mais de meio século de caracterizações preconceituosas na obra original. Que tal contratar um ator ou atriz asiática e escrever o personagem com respeito e bom senso, e não uma caracterização cartunesca e deturpada?


Escalar um ator ou atriz de cor em um papel originalmente branco não é carta branca para fazer o contrário depois, representação é sobre fazer justiça e dar oportunidade, não trocar pontos para o ‘’whitewashing’’ da semana que vem — muito menos o uso de minorias como personagens dispensáveis quando alguém precisa morrer para dar um senso de risco e mudança para um filme ou série incapaz de instigar sua audiência com uma trama interessante e inteligente.


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